4ª Jornada, Boavista vs Amarante, Sábado, 28 de Setembro, 16h00, Estádio do Bessa Séc. XXI

sábado, 13 de março de 2010

Entrevista do Presidente Álvaro Braga Júnior ao Jornal de Notícias

"Boavista é um milagre do dia-a-dia"

Presidente da SAD do Bessa equipara-se a "bombeiro voluntário", na emergência quotidiana de um clube que resiste como pode e que cultiva a esperança. Assim os tribunais reponham a justiça...

Administraram-lhe os sacramentos da extrema-unção. Anunciaram-lhe a morte. Muitos rezaram-lhe a confissão. Só os credores não lhe concedem absolvição. Falido, hipotecado e humilhado, o Boavista resiste aos diagnósticos e luta pela sobrevivência.

Um "milagre diariamente renovado", como verifica Álvaro Braga Júnior, presidente do que sobra da SAD do Boavista. E o apego à vida tem razão de ser, porque o emblema de 106 anos ainda acredita que tem futuro. Assim os tribunais reponham a justiça reclamada no Bessa...

Se as memórias da história são a argamassa do clube, o betão do Estádio do Bessa está ali para comprovar o que foi o teatro de tantos sonhos e de tantas gerações da tribo boavisteira. Mas o que o imenso palco representa é só a mais penosa herança do luxo de outrora. Ainda está novo em folha, mas o estádio erguido para o Euro 2004 é só um caco da ruína, insustentável. É um sorvedouro das poucas energias que restam a quem batalha diariamente por manter o clube ligado às máquinas. "É um elefante branco", resume Álvaro Braga.

"Nós não gerimos. Somos bombeiros voluntários, sempre ao serviço e sempre prontos para acudir a emergências. A nossa gestão é um milagre diário", observa o administrador do Boavista de cada vez que vem à tona para respirar da submersão nas dívidas, no passivo e no mar de credores que todos os dias lhe batem à porta. Ele é o Fisco, ele é a Segurança Social. Só a estes dois, a SAD devia 14 milhões de euros em meados do ano passado. E é por via desse fardo que o Estádio do Bessa está no prego.

E quanto vale o estádio, que está afectado no PDM como zona desportiva e, daí, sem outro valor palpável, designadamente imobiliário? "Sabe-se que custou cerca de 55 milhões de euros, sem qualquer contribuição da Câmara e apenas com o que estava contratualizado com o Estado", verifica Álvaro Braga.

E foi também deste abalançamento desmesurado que se fez a ruína boavisteira: por via da obra megalómana - que projectou um estádio de 30 mil lugares para uma base social de pouco mais de dez mil boavisteiros encartados -, o passivo do Boavista é hoje calculado em cerca de 80 milhões de euros. Ou seja, pagando um milhão por ano, a dívida será saldada em... 2090.

É um garrote agoniante, que deixa o clube com as vistas turvas e desesperado por investidores. De tal forma que qualquer charlatão se assemelha a um messias. Foi o que sucedeu em Abril de 2008, quando um coleccionador de passaportes, de nacionalidade portuguesa, francesa e norte-americana, apareceu de "Mercedolas" no Bessa. Que tinha fortunas em "off-shores" e que estava pronto a investir 9,5 milhões do pé para a mão. Afinal, o cheque era forjado e o mecenas um cidadão minhoto colectado nas Finanças como trolha e pintor. Foi mais um vexame para o Boavista.

E de quem é a culpa disto tudo? "A culpa é colectiva. É claro que ouve uma gestão ruinosa. Alguns sócios mais críticos assistiram à derrapagem e, na altura, não disseram nada, porque os resultados desportivos calavam tudo. Alguns desses críticos são os mesmos que me censuram o suposto branqueamento da gestão do dr. João Loureiro. É claro que tenho recebido palavras amigas e de solidariedade do major. E é preciso ver que os Loureiro são interlocutores da SAD. São accionistas de referência".

Neste cenário, que horizontes tem o Boavista? "Há futuro. O grande problema foi a descida administrativa...", afirma Álvaro Braga. Mas conforme se acha vítima de uma arbitrariedade administrativa, é nos mesmos códigos e cartapácios que o clube tem fé.

"Corre no Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa o pedido de anulação da deliberação daquela "segunda parte" do Conselho de Justiça da Federação que nos despromoveu administrativamente. No âmbito desse caso, a Federação apresentou queixa-crime contra o ex-presidente do CJ, Gonçalves Pereira, que o Ministério Público arquivou, num acórdão que é, ao mesmo tempo, muito crítico do parecer do dr. Freitas do Amaral. O processo já entrou na fase de alegações e só aguardamos decisão favorável. E se se considerar que o Supremo considerou e confirmou nulas as escutas a João Bartolomeu, presidente do Leiria, para efeitos de processos administrativos, mais razões temos para considerarmos que o Boavista tem futuro", afirma Álvaro Braga Júnior.

É desta convicção que o Boavista faz os impossíveis para manter viva a sociedade anónima, mesmo sem futebol profissional. Porque é através da SAD que poderá obter os despojos da guerra judicial e ser ressarcido do que julga ter sido uma arbitrariedade. E como avaliar os prejuízos? Como calcular indemnizações?

Batalha judicial

"É multiplicar o número de anos fora da primeira liga pelos contratos e receitas obtidas na época anterior à decisão do CJ. E isso incluiu muita coisa: contratos com jogadores, avaliação do plantel, ou direitos de transmissão televisiva. Na última época, as receitas televisivas ultrapassaram os três milhões de euros. E há as receitas expectáveis... Há muita coisa a ponderar", diz Álvaro Braga.

E porque acredita que o clube será absolvido e ressarcido, Álvaro Braga insiste que "o Boavista tem futuro". Mas nem por isso, nem na perspectiva de dias sorridentes e folgados, diz estar no Bessa "agarrado ao lugar", quando lhe faltam dois anos de mandato. "Se aparecer alguém com um projecto credível e sustentado, é claro que poremos imediatamente o nosso lugar à disposição", diz o administrador do Bessa.

E na agonia do respeitável ancião de 106 anos, Álvaro Braga observa, também, o que considera ser a indiferença dos tempos que correm. "Houve um ministro [NDR: Teixeira dos Santos, Finanças] que disse que o Porto estava moribundo. Eu não vou tão longe, mas sinto que a cidade está afastada de alguns dos seus maiores símbolos" , afirma o administrador da SAD do Boavista, no que será também um remate à figura de um sócio do clube. Esse mesmo, o presidente da Câmara.